25/01/2006

Não polaroids II

Passei grande parte da minha infância em casa dos meus avós.
E perdi um dos meus avôs muito cedo, com mais ou menos seis anos.

Falava tão pouco, tão pouco. Tinha o cabelo tão branco e a cara tão vermelha.
Vestia-se de preto. Muitas vezes, partia pedras no quintal, acto que eu insistia em imitar com o meu próprio mini-martelo e as minhas próprias pedras escolhidas a dedo; sentava-me perto dele sem que nenhum de nós dissesse nada. E não me lembro de mais nada dele.

No dia do funeral, deram-me um livro para colorir.
Pareceu-me simples, na altura, deixar de o ver.
Hoje em dia, aceito de muito pior maneira a ideia de deixar de ver alguém.

Não polaroids I

8 comentários:

Folha de Chá disse...

O apego vai crescendo, com o passar dos anos. As memórias aumentam. Será por isso.

Periférico disse...

Há que aproveitar enquanto cá estamos...

Beijos

MIN disse...

Aproveitar cada segundo!!!

Anónimo disse...

por falar nisto... ha alguém que vou deixar de ver dentro em pouco. Mas aceito, claro como uma coisa natural e que nao me mói o juizo.

Poor disse...

é natural...

Anónimo disse...

Para mim não há cá respirar fundo e esperar que corra tudo bem, nada de aproveitar o momento e essas filosofias de ponta. Há coisas que correm mal e outras que correm bem, faz tudo parte da vida. Só temos de esperar o pior e, se acontecer, chorar, porque temos o direito de ficar no fundo do poço algum tempo. E depois então, levantamos-nos, acendemos um cigarro, arregaçamos as mangas e voltamos ao mundo.

Mas claro, isso sou eu. E eu não sou exemplo para ninguém.


PS: Também tenho uma cicatriz proveniente de um acidente que me envolveu a mim, uma tampa de panela e uma esquina de madeira. Foi no meu 3º aniversário e ainda aqui está a marca, na testa, a observar o mundo cá do alto.

Ana disse...

Avôs já perdi os dois...um aos 14 e um aos 16...e guardo comigo montes de momentos para recordar...
A mãe perdi aos 10...Fecho os olhos e consigo ver a roupa, o cabelo, os sapatos, as carteiras, os adereços....consigo cheirá-la, ouvi-la...mas, assustadoramente não consigo, por muito que tente, reconstruir-lhe o rosto...
...
Mas, pronto..faz parte da vida...mas, é como dizes "Hoje em dia, aceito de muito pior maneira a ideia de deixar de ver alguém."

rukia disse...

uma beijoca lambuzada nessa cara, minha cara. :*